"O egoísmo pessoal, o comodismo, a falta de
generosidade, as pequenas cobardias do quotidiano, tudo isto contribui para
essa perniciosa forma de cegueira mental que consiste em estar no mundo e não
ver o mundo, ou só ver dele o que, em cada momento, for susceptível de servir
os nossos interesses."
José Saramago
O nu consumia o meu
todo subitamente natural, não racionalizado, nem socializado, apenas natural. Ali
estático, na firmeza paralisante do movimento. Subitamente inquietante,
questionando os traços que faziam do meu corpo, aquele corpo. O seu porquê, a
sua razão. Esmiuçando a sua universalidade, a sua maldita imperfeição tão
semelhante à existência que só por si era inexistente. Caminhando por ele,
caminhando através dele.
Rapidamente chegava à conclusão que não existia. Tal como o corpo, tal como a mente. Não existiam, não existíamos, não existias. Mas existia. Eu, de um modo erroneamente humano existia. Mas porquê Eu!? Porquê a necessidade solipsista de viver num Mundo individualizado!? Seria culpa da natureza!? Essa fatal e mórbida natureza (...)
Rapidamente chegava à conclusão que não existia. Tal como o corpo, tal como a mente. Não existiam, não existíamos, não existias. Mas existia. Eu, de um modo erroneamente humano existia. Mas porquê Eu!? Porquê a necessidade solipsista de viver num Mundo individualizado!? Seria culpa da natureza!? Essa fatal e mórbida natureza (...)
Assim, sem palavras, num silêncio gritante, na vulgaridade atroz da rotina continuei a andar. Nu. As pessoas olhavam para mim, para o meu corpo desnudado que em tanto era errado, não porque o naturalmente era, mas porque para elas o era. Ainda assim: nu, ninguém me via. Estavam cegas, superficialmente cegas e eu, eu estava nu. E o
que é a nudez aonde num Mundo onde todos vestimos para esconder!? Era pureza. Pureza
que embora pura, partia do sentimento da mais traiçoeira e engenhosa necessidade de nos despir
da malícia pragmática, num emergir que de certo modo, também ele era egoísta. Egoísta,
egoístas, todos o são, todos o éramos menos nós próprios. Mesmo a alma mais caridosa, fá-lo porque se sente bem ao
fazê-lo e porque sabe que se o fizer, será preenchida por um sentimento
caritativo. Hipócrita, hipócritas, todos o são, todos o éramos menos nós próprios.
Maldito eu, corrói-me por dentro, sinto-o borbotar da minha racionalização, do sentimento de “aqui e agora”, da percepção avassaladora de saber que eu sou eu, e mais ninguém o conseguirá ser. Mas como coexistir com outros “eus”!? Como coexistir numa realidade aonde todos somos, naturalmente, indivíduos e não comunidades!? Talvez esteja aí o nosso problema. Mas eu falo em nosso e não em meu.
Maldito eu, corrói-me por dentro, sinto-o borbotar da minha socialização, do sentimento de “ser o que sou através dos outros”, da percepção avassaladora de saber que eu sou o que sou, através dos conhecimentos que me permitiram uma evolução socializante. Mas como coexistir com conhecimento que não é nosso, genuinamente nosso!? Como coexistir numa realidade aonde todos somos, sociologicamente falando, comunidades e não indivíduos!? Talvez esteja aí o nosso problema.
Maldito eu, corrói-me por dentro, sinto-o borbotar da minha racionalização, do sentimento de “aqui e agora”, da percepção avassaladora de saber que eu sou eu, e mais ninguém o conseguirá ser. Mas como coexistir com outros “eus”!? Como coexistir numa realidade aonde todos somos, naturalmente, indivíduos e não comunidades!? Talvez esteja aí o nosso problema. Mas eu falo em nosso e não em meu.
Maldito eu, corrói-me por dentro, sinto-o borbotar da minha socialização, do sentimento de “ser o que sou através dos outros”, da percepção avassaladora de saber que eu sou o que sou, através dos conhecimentos que me permitiram uma evolução socializante. Mas como coexistir com conhecimento que não é nosso, genuinamente nosso!? Como coexistir numa realidade aonde todos somos, sociologicamente falando, comunidades e não indivíduos!? Talvez esteja aí o nosso problema.