sábado, 5 de outubro de 2013

Simulacrum

Gosto de descrever pessoas.

Reitero: gosto de pintar pessoas, através de palavras.
Reitero: gosto de criar pessoas, através do seu gesto.
Reitero: gosto de pensar que consigo ler os seus olhos
Reitero: gosto de imaginar novas pessoas, através das existentes
Reitero: gosto de escrever sobre a palavra, o olhar e o gesto
Reitero: gosto de pensar que descrevendo-as, estou perante uma alma desnuda
Reitero: mas quando as vejo desnudas, vejo-as verdadeiras

Ilações: e nos teus olhos vejo o lirismo de um poeta morto que só sabia escrever tragédias, olham para mim como se fossem eternos e como se a luz da vida sempre os acompanhasse, espero que a luz não os cegue, e que não te cegues a ti próprio tal Édipo. Agarro os teus pulsos, não sinto a pulsação e apenas a frieza do ódio, inato ao sangue, mas palpita, e num acto tão animal como sempre soubera que fôramos, pegas num estilhaço de alma partida e cortaste do peito à barriga, as vísceras escorregam-te pelo corpo, e por trás de uma humanidade sepultada, encontro um falso coração humano, esforçando-se por imitar o amor, e lá vejo a indignação dos deuses e vejo a inexistência da moral e vejo a inexorabilidade do pecado e vejo a inevitabilidade da fome e vejo a impureza do corpo e vejo a inutilidade do homem, sem fim, infinitamente.

Conclusão final: não queiras ter alma